Introdução
As eleições de 2026 começam a ganhar contornos mais definidos, ainda que de forma precoce. Entre os temas que despontam como determinantes para a escolha do eleitor brasileiro, a segurança pública emerge com força inédita. Não se trata de um tema novo, mas de uma pauta que retorna com intensidade renovada devido a acontecimentos recentes que abalaram a percepção social sobre o alcance das organizações criminosas no país.
Dois episódios foram fundamentais para essa virada:
- A operação contra o PCC em plena Faria Lima, região símbolo da elite econômica paulistana, tradicionalmente associada à segurança e estabilidade.
- As operações contra o Comando Vermelho no Rio de Janeiro, que, além de impactarem a dinâmica local, reforçaram a ideia de que o crime organizado possui capilaridade nacional, com capacidade de desafiar o Estado em diferentes níveis.
Esses eventos escancaram que o crime organizado não está mais restrito às periferias urbanas, mas ocupa e influencia espaços estratégicos da economia, da política e da vida cotidiana. Diante disso, fica claro por que a segurança pública deverá ser o eixo estruturante da disputa presidencial de 2026.
A Expansão do Crime Organizado e o Colapso da Percepção Tradicional de Segurança
Durante décadas, o debate sobre violência esteve restrito a temas como policiamento ostensivo, aumento de efetivo e investimentos em inteligência. No entanto, as organizações criminosas se profissionalizaram, ampliaram seus negócios e diversificaram suas bases territoriais, questionando o próprio conceito de segurança pública.
O PCC na Faria Lima: O choque simbólico
A operação que revelou a presença operacional do Primeiro Comando da Capital em uma das regiões mais valorizadas e vigiadas do país rompeu com narrativas consolidadas. Mostrou-se que o crime organizado não age apenas nas franjas da sociedade, mas circula, movimenta e infiltra-se em ambientes de alto fluxo econômico.
Esse episódio produziu três efeitos simbólicos e políticos decisivos:
- Quebra da ilusão de invulnerabilidade da elite econômica — se o crime opera na Faria Lima, nenhuma região está imune.
- Exposição da complexidade das redes criminosas, que articulam logística, lavagem de dinheiro e tecnologia de maneira semelhante a empresas formais.
- Ampliação da percepção de que o Estado perdeu capacidade de controle territorial e financeiro.
Esses fatores colocam pressão sobre candidatos, que precisarão apresentar propostas mais robustas, sistêmicas e articuladas para combater organizações que já funcionam como verdadeiras corporações paralelas.
Os confrontos com o Comando Vermelho no Rio: A guerra urbana permanente
Enquanto São Paulo lidou com o impacto de uma infiltração estrutural, o Rio de Janeiro vive há décadas sob a convivência com facções que controlam territórios, impõem leis paralelas e desafiam diretamente o Estado.
As operações recentes contra o Comando Vermelho reforçaram a noção de que a crise fluminense é parte de um quadro nacional. Muitos especialistas consideram que as disputas territoriais, o tráfico de armas e a penetração de milícias e facções estão interligados a uma cadeia criminosa muito maior, que atravessa fronteiras e sustenta-se em economias globais.
Assim, a eleição de 2026 tende a refletir esse quadro: candidatos terão de lidar com a percepção de que a violência não é um problema regional, mas sim um problema nacional.
Por que a Segurança Pública Será o Tema Central de 2026?
1. A violência como fator cotidiano do eleitor
Diferentemente de temas macroeconômicos, como taxa de juros ou déficit fiscal, a segurança é uma experiência imediata. Ela afeta diretamente a sensação de liberdade, deslocamento, trabalho e lazer.
Ao mesmo tempo, cresce a percepção de que o Estado está perdendo território para o crime organizado. Essa sensação, alimentada por episódios de grande repercussão midiática, cria o ambiente perfeito para que a segurança se torne uma pauta dominante nas eleições.
2. A crise nacional de confiança institucional
O Brasil atravessa uma crise de confiança que envolve:
- Polícias sobrecarregadas e mal remuneradas;
- Sistemas penitenciários controlados por facções;
- Políticas públicas fragmentadas;
- Conflitos entre esferas estaduais e federais;
- Percepção de corrupção e negligência governamental.
A partir disso, o eleitor começa a buscar candidatos que prometam controle, ordem e firmeza. Em momentos de incerteza, discursos mais duros tendem a ganhar força.
3. A ascensão de discursos securitários
É provável que parte dos candidatos adote narrativas que defendem:
- endurecimento penal;
- aumento de policiamento;
- militarização de fronteiras;
- unificação de bases de dados;
- investimento em inteligência;
- redução da maioridade penal;
- leis mais rígidas contra facções e milícias.
Esse tipo de abordagem acompanha uma tendência global, visível em países que enfrentam problemas semelhantes — como México, Colômbia e Estados Unidos.
4. A instrumentalização política das operações
As operações contra PCC e CV não são apenas acontecimentos policiais: rapidamente se tornam combustível eleitoral.
Cada candidato buscará enquadrar o debate de um lado:
- Oposição: acusará o governo federal de falta de controle e complacência com o crime organizado;
- Situação: defenderá que operações foram possíveis graças às políticas implementadas;
- Candidatos independentes: criticarão ambos os campos e proporão reformas estruturais.
O resultado é inevitável: o tema dominará o noticiário e o imaginário social.
O Brasil Como Campo de Batalha das Facções
Para compreender a potência do tema nas eleições, é preciso reconhecer que o Brasil tornou-se palco de disputas entre diferentes organizações criminosas que já não se limitam ao tráfico de drogas.
Hoje, essas facções dominam:
- Comércio ilegal de ouro e minérios;
- Tráfico de armas;
- Lavagem financeira global;
- Controle de serviços locais;
- Extorsão e sequestro digital;
- Influência política em favelas, bairros e cidades pequenas.
Assim, não se trata apenas de crime, mas de poder político, econômico e territorial.
O Papel do Estado: Falhas Estruturais e o Desafio de Reconstrução
A discussão eleitoral deverá enfrentar não apenas a repressão ao crime, mas a reestruturação de políticas públicas. Entre os grandes desafios estão:
1. Sistema penitenciário como incubadora do crime
Os presídios brasileiros são controlados por facções. Reformá-los será fundamental para quebrar o ciclo de recrutamento e expansão.
2. Integração de inteligência entre polícias
A falta de comunicação entre estados, União e instituições federalizadas é um grande problema. Facções atuam de forma integrada; o Estado, não.
3. Fronteiras escancaradas
O Brasil possui mais de 16 mil km de fronteiras terrestres, muitas sem vigilância eficiente. Armas e drogas entram livremente.
4. Ausência de políticas sociais em áreas dominadas por facções
Sem escolas, saúde, transporte e saneamento, a população permanece sob controle de organizações criminosas que suprem ausências estatais.
As Propostas Que Devem Dominar o Debate Eleitoral
Com base nos cenários mencionados, alguns eixos devem dominar programas de governo:
- Fortalecimento da Polícia Federal e cooperações internacionais;
- Tecnologia de rastreamento financeiro para combater lavagem de dinheiro;
- Modernização de presídios e isolamento de lideranças criminosas;
- Combate ao tráfico de armas e insumos químicos;
- Programas integrados de prevenção à violência;
- Requalificação urbana e retomada territorial;
- Combate direto a milícias, especialmente no Rio;
- Aumento da inteligência policial e uso de big data.
Cada candidato buscará encaixar seu discurso em um desses eixos, tentando associar-se à ideia de ordem, controle e protagonismo institucional.
Conclusão
As eleições de 2026 serão marcadas por uma pauta central: a segurança pública. Os episódios envolvendo PCC e Comando Vermelho escancaram que o crime organizado não apenas desafia o Estado, mas também infiltra-se nos espaços mais protegidos e simbólicos do país.
A crise é nacional, complexa e profunda. Por isso, o debate eleitoral não poderá mais se restringir a discursos superficiais. Os eleitores exigirão clareza, contundência e propostas concretas que articulem repressão, prevenção, inteligência e reconstrução institucional.
2026 será o ano em que o Brasil decidirá como enfrentar o maior desafio de sua história recente: a disputa pelo controle do território, da economia e da vida cotidiana frente ao poder crescente das facções