Introdução

As eleições de 2026 começam a ganhar contornos mais definidos, ainda que de forma precoce. Entre os temas que despontam como determinantes para a escolha do eleitor brasileiro, a segurança pública emerge com força inédita. Não se trata de um tema novo, mas de uma pauta que retorna com intensidade renovada devido a acontecimentos recentes que abalaram a percepção social sobre o alcance das organizações criminosas no país.

Dois episódios foram fundamentais para essa virada:

  1. A operação contra o PCC em plena Faria Lima, região símbolo da elite econômica paulistana, tradicionalmente associada à segurança e estabilidade.
  2. As operações contra o Comando Vermelho no Rio de Janeiro, que, além de impactarem a dinâmica local, reforçaram a ideia de que o crime organizado possui capilaridade nacional, com capacidade de desafiar o Estado em diferentes níveis.

Esses eventos escancaram que o crime organizado não está mais restrito às periferias urbanas, mas ocupa e influencia espaços estratégicos da economia, da política e da vida cotidiana. Diante disso, fica claro por que a segurança pública deverá ser o eixo estruturante da disputa presidencial de 2026.

A Expansão do Crime Organizado e o Colapso da Percepção Tradicional de Segurança

Durante décadas, o debate sobre violência esteve restrito a temas como policiamento ostensivo, aumento de efetivo e investimentos em inteligência. No entanto, as organizações criminosas se profissionalizaram, ampliaram seus negócios e diversificaram suas bases territoriais, questionando o próprio conceito de segurança pública.

O PCC na Faria Lima: O choque simbólico

A operação que revelou a presença operacional do Primeiro Comando da Capital em uma das regiões mais valorizadas e vigiadas do país rompeu com narrativas consolidadas. Mostrou-se que o crime organizado não age apenas nas franjas da sociedade, mas circula, movimenta e infiltra-se em ambientes de alto fluxo econômico.

Esse episódio produziu três efeitos simbólicos e políticos decisivos:

  1. Quebra da ilusão de invulnerabilidade da elite econômica — se o crime opera na Faria Lima, nenhuma região está imune.
  2. Exposição da complexidade das redes criminosas, que articulam logística, lavagem de dinheiro e tecnologia de maneira semelhante a empresas formais.
  3. Ampliação da percepção de que o Estado perdeu capacidade de controle territorial e financeiro.

Esses fatores colocam pressão sobre candidatos, que precisarão apresentar propostas mais robustas, sistêmicas e articuladas para combater organizações que já funcionam como verdadeiras corporações paralelas.

Os confrontos com o Comando Vermelho no Rio: A guerra urbana permanente

Enquanto São Paulo lidou com o impacto de uma infiltração estrutural, o Rio de Janeiro vive há décadas sob a convivência com facções que controlam territórios, impõem leis paralelas e desafiam diretamente o Estado.

As operações recentes contra o Comando Vermelho reforçaram a noção de que a crise fluminense é parte de um quadro nacional. Muitos especialistas consideram que as disputas territoriais, o tráfico de armas e a penetração de milícias e facções estão interligados a uma cadeia criminosa muito maior, que atravessa fronteiras e sustenta-se em economias globais.

Assim, a eleição de 2026 tende a refletir esse quadro: candidatos terão de lidar com a percepção de que a violência não é um problema regional, mas sim um problema nacional.

Por que a Segurança Pública Será o Tema Central de 2026?

1. A violência como fator cotidiano do eleitor

Diferentemente de temas macroeconômicos, como taxa de juros ou déficit fiscal, a segurança é uma experiência imediata. Ela afeta diretamente a sensação de liberdade, deslocamento, trabalho e lazer.

Ao mesmo tempo, cresce a percepção de que o Estado está perdendo território para o crime organizado. Essa sensação, alimentada por episódios de grande repercussão midiática, cria o ambiente perfeito para que a segurança se torne uma pauta dominante nas eleições.

2. A crise nacional de confiança institucional

O Brasil atravessa uma crise de confiança que envolve:

  • Polícias sobrecarregadas e mal remuneradas;
  • Sistemas penitenciários controlados por facções;
  • Políticas públicas fragmentadas;
  • Conflitos entre esferas estaduais e federais;
  • Percepção de corrupção e negligência governamental.

A partir disso, o eleitor começa a buscar candidatos que prometam controle, ordem e firmeza. Em momentos de incerteza, discursos mais duros tendem a ganhar força.

3. A ascensão de discursos securitários

É provável que parte dos candidatos adote narrativas que defendem:

  • endurecimento penal;
  • aumento de policiamento;
  • militarização de fronteiras;
  • unificação de bases de dados;
  • investimento em inteligência;
  • redução da maioridade penal;
  • leis mais rígidas contra facções e milícias.

Esse tipo de abordagem acompanha uma tendência global, visível em países que enfrentam problemas semelhantes — como México, Colômbia e Estados Unidos.

4. A instrumentalização política das operações

As operações contra PCC e CV não são apenas acontecimentos policiais: rapidamente se tornam combustível eleitoral.

Cada candidato buscará enquadrar o debate de um lado:

  • Oposição: acusará o governo federal de falta de controle e complacência com o crime organizado;
  • Situação: defenderá que operações foram possíveis graças às políticas implementadas;
  • Candidatos independentes: criticarão ambos os campos e proporão reformas estruturais.

O resultado é inevitável: o tema dominará o noticiário e o imaginário social.

O Brasil Como Campo de Batalha das Facções

Para compreender a potência do tema nas eleições, é preciso reconhecer que o Brasil tornou-se palco de disputas entre diferentes organizações criminosas que já não se limitam ao tráfico de drogas.

Hoje, essas facções dominam:

  • Comércio ilegal de ouro e minérios;
  • Tráfico de armas;
  • Lavagem financeira global;
  • Controle de serviços locais;
  • Extorsão e sequestro digital;
  • Influência política em favelas, bairros e cidades pequenas.

Assim, não se trata apenas de crime, mas de poder político, econômico e territorial.

O Papel do Estado: Falhas Estruturais e o Desafio de Reconstrução

A discussão eleitoral deverá enfrentar não apenas a repressão ao crime, mas a reestruturação de políticas públicas. Entre os grandes desafios estão:

1. Sistema penitenciário como incubadora do crime

Os presídios brasileiros são controlados por facções. Reformá-los será fundamental para quebrar o ciclo de recrutamento e expansão.

2. Integração de inteligência entre polícias

A falta de comunicação entre estados, União e instituições federalizadas é um grande problema. Facções atuam de forma integrada; o Estado, não.

3. Fronteiras escancaradas

O Brasil possui mais de 16 mil km de fronteiras terrestres, muitas sem vigilância eficiente. Armas e drogas entram livremente.

4. Ausência de políticas sociais em áreas dominadas por facções

Sem escolas, saúde, transporte e saneamento, a população permanece sob controle de organizações criminosas que suprem ausências estatais.

As Propostas Que Devem Dominar o Debate Eleitoral

Com base nos cenários mencionados, alguns eixos devem dominar programas de governo:

  • Fortalecimento da Polícia Federal e cooperações internacionais;
  • Tecnologia de rastreamento financeiro para combater lavagem de dinheiro;
  • Modernização de presídios e isolamento de lideranças criminosas;
  • Combate ao tráfico de armas e insumos químicos;
  • Programas integrados de prevenção à violência;
  • Requalificação urbana e retomada territorial;
  • Combate direto a milícias, especialmente no Rio;
  • Aumento da inteligência policial e uso de big data.

Cada candidato buscará encaixar seu discurso em um desses eixos, tentando associar-se à ideia de ordem, controle e protagonismo institucional.

Conclusão

As eleições de 2026 serão marcadas por uma pauta central: a segurança pública. Os episódios envolvendo PCC e Comando Vermelho escancaram que o crime organizado não apenas desafia o Estado, mas também infiltra-se nos espaços mais protegidos e simbólicos do país.

A crise é nacional, complexa e profunda. Por isso, o debate eleitoral não poderá mais se restringir a discursos superficiais. Os eleitores exigirão clareza, contundência e propostas concretas que articulem repressão, prevenção, inteligência e reconstrução institucional.

2026 será o ano em que o Brasil decidirá como enfrentar o maior desafio de sua história recente: a disputa pelo controle do território, da economia e da vida cotidiana frente ao poder crescente das facções

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